o abismo
hoje somos estrelas em extinção. pequenos pontos de fraca e distante luz. quase consumidos, de dentro para fora nos exaurimos de nós mesmos. arremessados na imensidão da vida, entre pulsos e vãs tentativas. se ao menos pudéssemos ser algo mais que pó e energia a desfazer-se no tempo. mas Saturno devora seus filhos. pondo-se a despedaçar as vontades e a atirá-las no abismo aos desígnios da sorte e da necessidade. e no abismo nos depositamos como orgulhosas massas fulgurantes que vão deixando atrás de si um rastro de poeira fina das cinzas de nossa vontade que é consumida em delírios da vertigem. o abismo é única realidade e a queda é a única vida que jamais conhecemos. nos diz um sábio que "a mais abjeta nostalgia oculta a nostalgia do paraíso". toda vontade é vontade de que o abismo termine, de um fundo que nos acuda, onde possamos nos recuperar e voltarmos a ser como éramos antes do infortúnio. mas não existe tal anteparo e não existe nem fim, nem descanso. nosso brilho foi consumido e extinto, e a poeira de nossos rastros é o sinal deixado para que aqueles que vêm atrás de nós não esqueçam: não existe retorno, o abismo é a única realidade, e alguns somos apenas a poeira largada no tempo.
Imagem: Sem Título, por Pam Steenwijk (2017).
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